Sem plano para saneamento ou desastres
14/11/2012
Sem plano para saneamento ou desastres
Autor(es): Alessandra Duarte
O Globo - 14/11/2012
Menos de 10% das prefeituras têm planejamento adequado em setores de infraestrutura urbana, diz IBGE
Só 7,1% das prefeituras no Brasil tem um plano para o saneamento básico da sua população - apesar de uma lei federal exigir que todas tenham esse plano até 2014. E é menor que isso - 6,2% - o número de municípios com plano para lidar com risco de desastres, como deslizamentos. A falta de preparo das cidades brasileiras em infraestrutura é um dos dados que mais chamam atenção na Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic) 2011, divulgada ontem pelo IBGE.
O instituto já pesquisa, em outros estudos, a existência de serviços de saneamento, como coleta de esgoto, mas pela primeira vez pesquisou, pela Munic, a gestão municipal para o setor. Também pela primeira vez, a pesquisa mediu a existência de planos municipais de redução de riscos de desastres, como deslizamentos e enchentes; no Sul e no Nordeste, com os menores percentuais, 4,4% e 4,7% das cidades, respectivamente, têm esse tipo de plano. O Sudeste tem 9,6%. Outros temas novos na Munic são a pesquisa de políticas de inclusão e de combate à discriminação nas escolas, além da existência de legislação municipal sobre direitos da população LGBT.
Sancionada em 2007 e regulamentada em 2010, a Lei Nacional de Saneamento Básico exige que os municípios tenham um plano municipal de saneamento até 2014 - os que não tiverem não poderão mais receber verba federal em saneamento enquanto não elaborarem o plano. No entanto, a Munic mostra que vai ser grande a parcela de prefeituras que terá de correr para montar seu plano: 7,1% das cidades brasileiras não têm plano municipal de saneamento, percentual que vai a 4,1% no Nordeste, em pior situação; com melhor quadro, mas mesmo assim num percentual muito baixo, está o Sul, com 11,4% das cidades com plano.
A regulação e a fiscalização municipais do setor também são incipientes em grande parte dos casos: 73% dos municípios não definiram norma de regulação do serviço de saneamento; 60,5% não têm procedimento de acompanhamento das licenças ambientais de saneamento; 47,8% não têm órgão responsável por fiscalizar a qualidade da água; e 56% não têm nenhum mecanismo de controle social dos serviços de saneamento.
- Os municípios confundem muito gestão do saneamento com prestação do serviço na área, quando a gestão não é só prestar serviço - diz a gerente da Munic, Vânia Maria Pacheco. Perguntada se a situação da gestão municipal em saneamento e habitação prejudicaria programas como o PAC, disse: - Não ajuda. O ideal é que as coisas caminhem juntas.
Municípios têm dificuldade de se planejar
O fato de a legislação para saneamento ter sido recentemente criada é um dos fatores que atrasaram seu desenvolvimento institucional, diz Edison Carlos, presidente do Instituto Trata Brasil.
- Não havia base legal, o que afastou o setor privado, que não sentia o que chamam de segurança jurídica. Esses números da pesquisa do IBGE mostram esse atraso e a dificuldade que as prefeituras têm de se planejar. O PAC anda de lado há uns cinco anos muito por conta dessa situação, você carimbou dinheiro para um setor despreparado - afirma Carlos, lembrando que a lei de 2007 deixou claro que a titularidade pelos serviços de saneamento é da prefeitura.
- O problema aí é muito mais de gestão que de dinheiro. Há recurso federal não usado porque não há projetos com qualidade - completa Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústria de Base.
Na prevenção de riscos contra deslizamentos e enchentes, o quadro não é muito melhor. A Munic aponta que só 32,6% dos municípios realizam ações de gerenciamento de risco de deslizamento e recuperação ambiental preventiva.
Estados que sofrem com desastres também têm quadro crítico: em Santa Catarina, só 17 das 293 cidades têm plano de redução de riscos; em Alagoas, apenas 6 dos 102 municípios; e em Pernambuco, 26 de um total de 185.
- Faltam planos municipais de prevenção e monitoramento a desastres, é preciso mais que o alerta, para que a ocupação do solo, atribuição municipal, seja a mais adequada possível - avalia Luiz Cesar Queiroz Ribeiro, professor do Ippur/UFRJ e coordenador do Observatório das Metrópoles. - Ainda falta, em infraestrutura, uma política nacional de fortalecimento técnico das prefeituras. A verba para construção de casas do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social poderia, por exemplo, ser atrelada à inclusão de ações contra desastres nos planos diretores municipais.
Segundo a lei 12.608/2012, que cria a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil, municípios incluídos em cadastro de áreas suscetíveis de desastres têm até um ano para elaborar um plano de contingência de proteção e defesa civil.
Secretário-geral da Associação Brasileira de Municípios (ABM), José Carlos Rassier lembra que é baixo o volume de recursos municipais para investimento, necessário em setores como habitação e saneamento:
- A parcela do orçamento anual dos municípios para investimento não ultrapassa 3% em média. As prefeituras precisam melhorar sua qualificação para conseguir outros recursos, profissionalizar suas equipes por meio de planos de carreira e de concurso e estender benefícios associados a desempenho. Mas o governo federal também precisa auxiliá-las nisso, e coordenar políticas que se integrem aos estados e municípios.
Procurado, o Ministério das Cidades afirmou apenas que "avalia os resultados" da Munic.
Fonte: Oglobo.com
Imagem: Tratabrasil.org.br