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Para 92% dos ginecologistas, planos dificultam exames
31/08/2012
Para 92% dos ginecologistas, planos dificultam exames
Operadoras interferem nos procedimentos mais caros,aponta pesquisa Datafolha
Secretário do conselho de medicina diz que a prática irregular é uma estratégia para paciente desistir do exame
TALITA BEDINELLI
DE SÃO PAULO
Grávida de 30 semanas, a analista financeira Thaíse Pereira da Silva, 25, teve dificuldades para marcar dois ultrassons recentemente.
Após uma confusão com a Golden Cross, que resultou na demora das autorizações do exame, ela decidiu pagar R$ 175 para fazê-los a tempo da consulta com o obstetra.
A médica Maria Rita Mesquita diz que recentemente foi obrigada a encaminhar um documento justificando um pedido de mamografia para uma paciente de 40 anos. O convênio, não informado para a reportagem, alegou que, sem isso, não autorizaria o exame.
Ela relata ainda dificuldades para conseguir internar pacientes para a colocação de DIUs (dispositivos intrauterinos) hormonais, que precisam de anestesia, e para realizar laparoscopias para diagnosticar endometriose.
Queixas assim são comuns entre ginecologistas e obstetras, mostra pesquisa Datafolha feita a pedido da Sogesp (Associação de Obstetrícia e Ginecologia de São Paulo).
Segundo o levantamento, 97% dos médicos dessa especialidade dizem que há algum tipo de interferência dos convênios, como o não pagamento de procedimentos, a análise de pedidos médicos por meio de auditores e a delimitação de tempo de internação pré e pós-operatória.
Para 92%, os planos dificultam a realização de procedimentos mais complexos, que costumam ter mais custo para as operadoras.
"Hoje não conseguimos que uma mãe fique mais de três dias internada após o parto. Se o bebê tem alguma complicação, ela recebe alta, mas tem que ficar o dia inteiro no hospital para amamentar sem ter acesso a um quarto", diz a obstetra Maria Rita, que é diretora da Sogesp.
Para Braúlio Luna Filho, primeiro-secretário do Cremesp (Conselho Regional de Medicina de SP), a prática é irregular. "O plano não pode interferir na autonomia do médico. Dificultar os procedimentos é uma estratégia para ganhar tempo e fazer o paciente desistir do exame."
Nos principais planos, um auditor ou um sistema eletrônico analisa o pedido do médico. Se o paciente, por exemplo, não têm idade e condições médicas que justifiquem o pedido, ele é negado, ou o médico é procurado para explicar o pedido.
BAIXOS VALORES
Os médicos também reclamam da baixa remuneração dos procedimentos. Em 6 de setembro, todas as especialidades pretendem paralisar por um dia atendimentos a planos na cidade. O objetivo é fazer os planos negociarem.
Outro lado
Operadoras dizem que respeitam decisão dos médicos credenciados
FenaSaúde, que reúne os 15 principais planos, afirma que outra pesquisa mostra 80% de satisfação de usuários
DE SÃO PAULO
A FenaSaúde, que reúne as 15 principais operadoras, diz que suas associadas incentivam o uso do plano, já que têm a prática de realizar campanhas lembrando mulheres da importância da realização de exames ginecológicos.
A entidade diz que pesquisa recente encomendada pelo Instituto de Estudos da Saúde Suplementar ao Datafolha aponta que 80% dos usuários estão satisfeitos com os seus planos de saúde.
A Amil, operadora apontada na pesquisa da Sogesp como a que mais interfere no trabalho médico, e a Medial, do mesmo grupo, que fica em quinto, afirmam que respeitam a autonomia médica e que têm rigoroso processo de seleção de seus credenciados.
A Intermédica diz que a maior parte de seus ginecologistas e obstetras atuam em hospitais próprios da operadora e seguem as orientações de entidades médicas. Diz ainda que não há interferência e que investe em programas de pré-natal.
A SulAmérica, terceira no ranking, afirma que cumpre as diretrizes estabelecidas pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). A Bradesco, que vem em seguida, disse que não teve acesso à pesquisa e, por isso, não se manifestaria. Mas disse que respeita a legislação vigente.
A Unimed Paulistana, sexta colocada, diz que seus médicos são cooperados e têm total independência para trabalhar. Também disse que as solicitações passam por uma análise administrativa e médica e que, após a aprovação da auditoria, a solicitação é liberada no prazo da ANS.
A Golden Cross, que não aparece no ranking entre as mais reclamadas, afirma que está apurando o caso de Thaíse Pereira da Silva.
Análise
É papel da ANS promover o equilíbrio de interesses
EM QUE PESEM AS RECENTES MEDIDAS PROMOVIDAS PELA AGÊNCIA, HÁ MUITO TRABALHO AINDA A SER FEITO
CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO
Não é de hoje que os médicos reclamam do alto grau de interferência dos planos de saúde nos diagnósticos e tratamentos e da baixa remuneração por seus serviços.
Já os planos de saúde criticam os médicos pelo excesso de pedidos de exames e de procedimentos desnecessários, o que encarece muito o custo e coloca em risco a saúde do paciente.
Há vários estudos que demonstram a relação entre a radiação emitida por raios-X e tomografia e um maior risco de desenvolver câncer.
Os argumentos dos médicos e dos planos são legítimos. As próprias entidades médicas reconhecem a piora da qualidade dos profissionais que chegam ao mercado, que mal olham o paciente e já pedem exames.
Também é fato que muitos planos de saúde, por meio de seus auditores, interferem na prática médica, vetando ou exigindo justificativas que prejudicam o paciente.
A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), que deveria promover o equilíbrio de interesses, é criticada por omissão e por não exercer seu dever de fiscalização.
Em que pesem as recentes medidas promovidas pela agência, como a suspensão de planos e a imposição de prazos para atendimento, há muito trabalho ainda a ser feito.
E isso passa pela melhoria nos modelos de remuneração dos prestadores de serviços e a regulação desse setor.
A ANS pretende instituir o pagamento por desempenho. Hoje, os hospitais privados recebem das operadoras de saúde uma remuneração fixa. Mas na conta que é repassada para o plano, estão incluídos também insumos usados durante a internação, como medicamentos, seringas e próteses.
O modelo incentiva o consumo porque, quanto mais insumos forem usados, maior será o valor pago pelo plano aos hospitais.
Nos EUA, mais de 50% dos planos de saúde têm programas com contratos baseados no desempenho dos serviços.
A expectativa é que, melhorando os modelos de remuneração dos hospitais, por exemplo, sobrará mais recursos para o pagamento dos médicos. A conferir.
Falta de médicos é problema estrutural, afirma estudo
Segundo levantamento do Conselho Federal de Medicina, carência na rede pública não se corrige com novas vagas de graduação
JOHANNA NUBLAT
FLÁVIA FOREQUE
DE BRASÍLIA
O problema da carência de médicos na rede pública do país depende de reformas estruturais na área de saúde, e não do aumento de profissionais no mercado de trabalho.
A conclusão é de estudo do CFM (Conselho Federal de Medicina), que rebate a política do governo da presidente Dilma Rousseff de abrir novas vagas de graduação em instituições de ensino.
"O aumento do efetivo médico, via abertura de mais cursos de Medicina ou políticas pontuais de incentivos e flexibilidades, acentuará ainda mais as desigualdades", afirma o estudo ao comentar a distribuição e quantidade de leitos do SUS nos Estados.
O levantamento aponta o subfinanciamento público da saúde como um dos fatores da deficiência. Enquanto no Brasil 44% do gasto com saúde é público, o percentual chega a 66% na Argentina e a 84% no Reino Unido.
Para Roberto D'Ávila, presidente do CFM, trata-se de um "equívoco proposital" a decisão do governo de aumentar o número de vagas de medicina. Essa medida, afirma, visa "mascarar a falta de investimentos".
O conselho alega ainda não haver um déficit generalizado de médicos, mas focos de desassistência pela falta de estrutura e de incentivos para que os profissionais fiquem no interior do país.
Doutora em saúde pública, a médica Lígia Bahia tem avaliação semelhante: além da necessidade de valorização do sistema público, ela defende o aumento de residências médicas em regiões hoje carentes de profissionais.
EXPANSÃO
Atualmente, das 16.400 vagas em cursos de medicina, 3.200 estão no Nordeste (19,7% do total). A região responde por 13,8% do total de residências ofertadas no país no mesmo ano (8.489).
Secretário de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Mozart Sales diz que o governo adota medidas para expandir as vagas da especialização médica."Estamos trabalhando fortemente para ampliarmos em 4.000, até 2014, o número de vagas".
Segundo o secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior, Jorge Messias, os ministérios da Saúde e Educação têm diversas políticas para mudar esse cenário. "O governo federal está comprometido com essa visão sistêmica."
Fonte: Folha.com
Imagem: Folha.com