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Muito longe do mundo de Angelina Jolie

19/05/2013

"Muito longe do mundo de Angelina Jolie

Janine Moraes/CB/D.A Press

Geneci foi obrigada a recorrer a clínicas privadas para fazer os exames que confirmaram o câncer em um dos seios

Exames genéticos para prevenir câncer estão fora do alcance de brasileiras. Apenas 20% das que estão na faixa etária de risco se submetem à mamografia

pelo SUS

»RENATA MARIZ

A coragem de Angelina Jolie, que retirou as duas mamas para se proteger de um provável câncer agressivo, sugerido por um teste genético de última geração, chamou a atenção do mundo inteiro na última semana. Não faltaram elogios à determinação da atriz diante da decisão de abdicar de uma parte do corpo tão ligada à feminilidade. Mas o episódio serviu também para reacender o debate sobre métodos de prevenção e de como diagnosticar a doença na fase inicial. Aqui e na maioria dos países, o exame que Jolie fez para descobrir a mutação no gene associado à doença e a própria mastectomia de precaução estão fora da lista de serviços oferecidos gratuitamente pelo governo devido ao custo elevado. No Brasil, porém, nem mesmo o teste mais elementar para detectar esse tipo de câncer tem cobertura pública satisfatória. Somente 20% das brasileiras em faixa etária de risco dos 50 aos 69 anos se submetem à mamografia pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

O levantamento, produzido pela Rede Goiana de Pesquisa em Mastologia, segue padrões estatísticos internacionais, relacionando as informações do Ministério da Saúde sobre mamografias feitas no país com o tamanho da população feminina de 50 a 69 anos de cada unidade da Federação, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (veja o quadro ao lado). Embora os dois bancos de dados se refiram a 2010, as conclusões retratam o panorama atual da oferta pública de mamografias no Brasil, garante Ruffo de Freitas Júnior, da Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM) e um dos pesquisadores envolvidos no levantamento. Houve uma melhora na assistência, mas, também, houve o ingresso de pessoas nessa faixa etária. Eu não tenho dúvidas de que os números de 2010 refletem bem 2013 , afirma o médico, que é diretor da Escola Brasileira de Mastologia da SBM.

Em um país em que 75% da população não têm plano de saúde, é de espantar que somente 20% das mulheres com risco de câncer procurem anualmente o SUS para fazer mamografias. Boa parte delas, no entanto, recorre a clínicas privadas. Sobre a oferta na rede particular, só há dados de Goiás. Lá, 52% das mulheres com mais de 50 anos pagaram para fazer a mamografia. Somadas às que conseguiram pelo sistema público, o total não chega a 70%. Significa que temos 35% de mulheres que não fizeram (o exame preventivo), nem pelo SUS nem na saúde suplementar, no ano analisado , explica Freitas Júnior. Estudo do IBGE de 2008 (o mais recente sobre saúde feminina) mostrou que 30% das brasileiras de 50 a 69 anos nunca haviam feito mamografia na vida. Uma estatística aterradora, especialmente diante da estimativa da SBM de que uma a cada 12 mulheres no país terá câncer de mama.

Demora

Geneci Luiz da Costa passou dois anos sentindo dores e repetindo mamografias na rede pública do Distrito Federal. Os médicos simplesmente não enxergavam nada nas imagens. Mas a mulher viu a mama esquerda crescer rapidamente. Impaciente com a demora a cada exame que precisava fazer, ela comprometeu boa parte do salário de empregada doméstica para pagar a mamografia em uma clínica particular. Quando o médico viu o laudo, mandou Geneci fazer uma biópsia urgente. Ele mesmo disse que pelo governo ia demorar dois ou três meses e que eu precisava do resultado rapidamente , lembra a goiana de 54 anos. Teve de apertar o orçamento outra vez, recorrendo a um hospital particular. Até que recebeu a notícia de dois nódulos grandes.

Eu fiquei muito triste, chorei. Pensei: meu Deus, sou muito nova para morrer . Mas resolvi lutar para ficar aqui com as minhas três filhas. Decidi fazer tudo que eu pudesse para viver. Só me desesperava com a demora no atendimento, porque o câncer não espera , recorda Geneci. A moradora de Ceilândia passou pela cirurgia de retirada da mama em 2011 e já começou o processo de reconstrução do seio.

Geneci só fica com o semblante mais sério quando se lembra das amigas de tratamento que tiveram complicações. Entre as mulheres, o câncer no seio é o que mais mata. São 12 mil mortes por ano, segundo o Ministério da Saúde, que representam 15% dos óbitos femininos decorrentes da doença no país. Para este ano, a estimativa é de 52,6 mil novos casos de tumores malignos de mama. Por ano, a rede pública faz, em média, 12 mil mastectomias. O procedimento só é indicado no SUS quando a paciente chega com a doença em estágio avançado ou quando o câncer é agressivo.

Reforço na prevenção

Para a mastologista Maira Caleffi, presidente da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), o governo precisa reforçar o atendimento preventivo. Houve expansão do serviço de mamografia, mas ainda é difícil. E depois, com um exame alterado nas mãos, as mulheres não conseguem fazer biópsia pelo SUS , diz Maira.

Só depois dessa fase, com a detecção da doença e a inclusão do paciente no sistema informatizado, é que começa a correr o prazo de 60 dias para início do tratamento, conforme lei que entra em vigor nesta semana. E antes disso, o que a pessoa faz? O problema é anterior ao tratamento, começa ainda lá na prevenção , reclama a mastologista. Esta semana, em Brasília, a Femama fará um evento aberto à comunidade para discutir as dificuldades do atendimento público às mulheres com câncer de mama."

Fonte e Imagem: Cofen.com