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Bens de consumo mais acessíveis do que os serviços essenciais

16/06/2013

"Bens de consumo mais acessíveis do que os serviços essenciais

Apesar de não contar com saneamento no bairro onde mora, em Santa Cruz, Edir, de 55 anos, conquistou itens como celulares, computador e banheira Apesar de não contar com saneamento no bairro onde mora, em Santa Cruz, Edir, de 55 anos, conquistou itens como celulares, computador e banheira Foto: Custódio Coimbra / Agência O Globo
Natanael Damasceno,Selma Schmidt - O Globo

RIO - Dois celulares, computador, geladeira, TV e banheira. Apesar das dificuldades de viver numa comunidade ainda sem saneamento e das longas caminhadas para chegar ao ponto de ônibus, Edir Dariux Teixeira, de 55 anos, abre com orgulho a porta de sua casa própria no Bairro Canaã, em Santa Cruz, onde mora há 19 anos, e diz que sua vida mudou para melhor. Um processo que começou quando deixou de pagar aluguel: há 19 anos, ganhou o terreno de um tio e começou a construir o seu imóvel. Com a pensão do pai, ex-funcionário do estado, passando roupa, fazendo e vendendo biscoitos e trabalhando como acompanhante em hospitais, Edir é um exemplo das mudanças por que vem passando a cidade e dos contrastes que ainda saltam aos olhos de quem se debruça sobre os números que a definem.

— Sou uma pobre metida à besta, tentando ajudar outros pobres — define-se Edir, que preside a associação de moradores da comunidade.

A antena da Sky, do lado de fora da casa, não é um sinal de que Edir tem TV com canais especiais. É só enfeite. Já o computador funciona, mas não tem internet. O piso foi ela que colocou. Edir também quebrou uma parede para criar uma cozinha americana. E o banheiro da casa ganhou uma banheira, que ela mesma instalou. Tudo porque um médico lhe recomendara hidroginástica para cuidar de sua coluna.

Apesar dos bons ventos que sopram nas favelas, estudos realizados por técnicos do Instituto Pereira Passos (IPP) sobre números dos censos de 2000 e 2010 mostram que o Rio ainda é um município de renda mal distribuída, quando se compara a situação das diferentes Regiões de Planejamento (RP). Fazendo as contas, a RP de maior renda (Zona Sul) tem um valor 7,6 vezes maior que a RP de menor renda (Santa Cruz).

E mais: os técnicos chegaram à conclusão de que, apesar da melhoria da renda média per capita em toda a cidade, principalmente nas áreas mais nobres, a distância entre os mais ricos e os mais pobres aumentou. Enquanto quase todas as camadas de renda tiveram aumento da renda per capita, a dos mais ricos foi a que alcançou um crescimento mais significativo, de 2,8% (valor real) ao ano. Além disso, enquanto na RP da Barra os 20% mais ricos têm renda 58,9% superior à dos 20% mais pobres, em Madureira, a diferença é de 16,1%.

O estudo do IPP, que foi dividido em painéis temáticos, será depois disponibilizado no Armazém de Dados, o site da instituição. Segundo a presidente do órgão, Eduarda La Roque, o trabalho vai ajudar a cidade a planejar suas políticas públicas:

— A gente produz dados para gerar informação, com o objetivo de melhorar as políticas públicas da cidade. Para mudar a realidade, é preciso conhecê-la.

Para o sociólogo Marcelo Burgos, do Departamento de Ciências Sociais da PUC, o Rio ainda é muito tímido na construção de políticas públicas visando a diminuir as desigualdades entre asfalto e favela. Essas políticas, diz ele, precisam ser mais fortes e abrangentes. O sociólogo entende que as UPPs criam condições favoráveis para que ações sejam implementadas. Condições essas, acrescenta, que precisam ser aproveitadas:

— Agora não se tem mais o tráfico como desculpa — diz Burgos.

Já a política de urbanização de favelas, na avaliação do especialista, estacionou no Rio, o que explica o baixo índice de saneamento das comunidades:

— Houve avanços históricos no que se refere ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC, do governo federal). Mas o programa é caracterizado por grandes intervenções. O alcance de saneamento do PAC é pequeno. Já o Morar Carioca (da prefeitura) praticamente não saiu do papel, e o saneamento não é prioridade."

Fonte e Imagem: Oglobo.com