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2. Educadores vencem dificuldades e transformam processo de ensino

16/10/2012

2. Educadores vencem dificuldades e transformam processo de ensino

No Dia do Professor, a Agência Brasil traz uma série de matérias com exemplos de educadores que se diferenciam na profissão mais importante, e talvez mais desvalorizada do País. Aos mestres, nosso carinho e respeito.

De calça vermelha, tênis preto de cadarços também vermelhos e camisa xadrez, o professor Wagner Júnior chama a atenção pelo visual despojado. Ele dava aulas de história geral em escolas públicas do Distrito Federal (DF) e ajudou a mudar a história de seus alunos. Com muitas ideias, conseguiu uma câmera e passou a desenvolver projetos de educação usando ferramentas da comunicação.

Um deles é o Programa Parabólica, que funciona no Centro de Ensino Médio 1 (CEM 1) de Sobradinho, cidade do DF. As produções, que abordam temas ligados à juventude, como educação, drogas, saúde e sistema de cotas em universidades, são exibidas na internet ou transmitidas pela TV Cidade Livre, de Brasília, parceira do projeto. As pautas são discutidas semanalmente por um grupo de alunos e ex-alunos da escola, que se reúne no local onde antes funcionava um depósito da unidade. Hoje, o pequeno cômodo, chamado de QG, sigla de quartel-general, tem porta grafitada, pufes coloridos e o entra e sai de quem está sempre em atividade.

São histórias assim, de educadores que vencem as dificuldades do dia a dia e transformam o processo de ensino em uma experiência democrática, criativa e bem-sucedida que a Agência Brasil conta hoje (15), no Dia do Professor.

Com o entusiasmo típico dos jovens, Wagner Júnior diz que decidiu trocar as salas de aula tradicionais, com mesas, cadeiras e quadro-negro, por ambientes menos formais e mais coloridos após perceber que o conteúdo de suas lições não despertava o interesse dos alunos. A inquietação diante do que via levou o professor a projetar nova prática pedagógica.

"Me angustiava muito ver que os alunos não se interessavam tanto pelo conteúdo das minhas aulas. Por outro lado, percebia que eles queriam estar conectados, estavam muito ligados às redes e mídias digitais. Decidi, então, fazer delas minhas aliadas".

Ele acredita que o educador precisa renovar o fôlego para superar a falta de estrutura e os salários que "não estão à altura da importância da atividade". Com mais de 20 anos de profissão, Wagner Júnior diz que a maior recompensa é ver os jovens tomando consciência de quem são e posicionando-se de forma intelectualmente autônoma diante de sua realidade.

"O educador é pouco valorizado pela lógica capitalista, do ponto de vista do rendimento financeiro, mas é muito valorizado pela lógica humana. A escola é lugar de se fazer amigos e é isso que mais ganho aqui", acrescenta.

A paixão pelo ensino e a vontade de mudar a vida dos alunos também são as características mais evidentes na equipe pedagógica da Escola Classe Córrego das Corujas, na zona rural de Ceilândia, outra cidade do DF. Rosemar Barbosa é uma das três professoras que trabalham na unidade. Para chegar à escola, ela leva, diariamente, 40 minutos e enfrenta seis quilômetros de estrada de terra, mas diz que não "quer sair dali por nada".

"Já trabalhei em escolas que ficavam a dez minutos da minha casa, mas sou apaixonada pelo trabalho que a gente faz aqui, com impacto direto não apenas no processo de aprendizagem do aluno, mas também na vida das famílias da comunidade", diz. Para ela, a estrutura simples e os recursos limitados não desestimulam o trabalho de quem quer fazer a diferença.

"Não temos muitos recursos aqui, mas aproveitamos o que está disponível e provamos que é possível mudar. Ver o crescimento dessas crianças e o sorriso no rosto delas renova o nosso ânimo", acrescenta.

De acordo com a diretora da escola, Suélia Gomes, foi essa dedicação à arte de ensinar, somada à integração entre as profissionais que levaram a escola a ser reconhecida como exemplo de sustentabilidade. Este ano, o projeto Saber Viver: Uma Escola Sustentável foi premiado durante o Circuito de Ciências de Taguatinga, promovido pela Secretaria de Educação do DF.

"Por meio do projeto, incentivamos os alunos a trazer material reciclável que virava lixo e acabava sujando a própria comunidade. Com isso, construímos vários objetos de lazer aqui na escola e conscientizamos as famílias sobre a importância do descarte responsável e do reaproveitamento de materiais", explica.

Como resultado do projeto, os alunos construíram, com a ajuda dos professores, uma casinha de bonecas usando caixas de leite, além de mesas e cadeiras feitas com madeira de caixotes reaproveitada. As brincadeiras também foram incrementadas com castelos de princesas construídas com latas de leite em pó, flores de rolo de papel higiênico e super-heróis de garrafas PET.

Física e matemática - Jogos eletrônicos, filmes em 3D e realidade aumentada, tecnologias que ainda são desconhecidas por parte dos jovens brasileiros. Ao perceber que seus alunos, de Petrópolis, não entendiam o que é um filme em 3D por nunca terem assistido a uma produção com essa tecnologia, o professor de matemática Guilherme Erwin Hartung decidiu mostrar a eles O Fantástico Mundo 3D.

O projeto deu tão certo que Hartung recebeu, no ano passado, o Prêmio Professores do Brasil, concedido pelo Ministério da Educação (MEC). Durante as atividades oferecidas fora do horário das aulas, sem valer nota, 15 estudantes montaram um site com imagens em 3D produzidas por eles mesmos.

Antes tiveram oficinas de biologia, para saber como funciona o olho humano, de física, sobre polarização da luz, e, claro, de matemática, para entender e calcular a geometria envolvida na produção das imagens com a sensação de profundidade. Também foram feitas visitas a institutos de pesquisa e a um laboratório de computação, além de participarem de uma videoconferência com especialista em 3D de Hollywood. Tudo graças ao empenho do professor, que também é orientador tecnológico no Colégio Estadual Embaixador José Bonifácio, de ensino médio.

"Os alunos gostaram, alguns disseram que a questão da física mudou, tem muito aluno que diz que odeia física, mas, quando vê a física aplicada, uma coisa interessante, palpável, passa a ver a física com outros olhos. A professora de biologia também comentou que os alunos realmente aprenderam o sistema de visão. Em matemática, os 15 que frequentaram o projeto todo realmente aprenderam as razões trigonométricas", contou Hartung.

Para ele, o incentivo de um professor é suficiente para mudar o destino de um aluno. "Com certeza, [entre] os alunos que participaram do [projeto] 3D, muitos falam em fazer faculdade na área de TI [tecnologia da informação], já estão correndo atrás, escolheram faculdade, Enem [Exame Nacional do Ensino Médio], vestibular. Fiquei feliz porque, não sei se o projeto contribuiu para isso, mas com certeza abriu um pouco a cabeça deles nesse sentido."

Outro projeto desenvolvido por ele no colégio de Petrópolis envolve uma atração irresistível para praticamente todo adolescente: os jogos eletrônicos. O professor observou o quanto é diferente o comportamento do aluno enquanto joga e quando está na escola.

"Quando joga, ele 'morre' na mesma fase 100 vezes e continua tentando. Quando ensino matemática e o aluno erra o exercício, fica frustrado e não que mais fazer. Outra coisa é a concentração, quando o adolescente joga está muito focado, o que não acontece na aula. Tem também o desafio, a próxima fase precisa ser mais difícil do que a anterior. Na aula, se você dá um exemplo fácil para entender a mecânica primeiro e dá exemplos mais difíceis, dizem 'está complicando a nossa vida'."

A ideia do professor, que tem formação técnica em TI, foi estimular os alunos a produzirem seus próprios jogos. "A única regra que tinha era: esse jogo tem que você vai criar tem que ensinar alguma coisa para alguém". O professor usou softwares livres e fáceis de trabalhar, em que é possível montar a estrutura de um jogo. Nesse caso, também foram dadas oficinas sobrematemática aplicada, indústria de games, programação, desenho e linguagem visual de um jogo.

Com isso, no primeiro ano do projeto foram produzido cerca de 30 joguinhos. "Percebi a melhora de alguns alunos em matemática depois do projeto. O interessante é que muitos dos jogos foram aproveitados pelos professores em sala de aula e alguns foram demandados. Isso é bem inovador, o aluno participar da prática do professor, e também a visão inovadora de usar jogos em sala de aula".

A motivação para Hartung vem do próprio exercício da profissão. "Com o cargo de orientador tecnológico, eu tinha 12 horas e um laboratório de informática, não podia deixar os alunos jogando e entrando no Facebook, então comecei a inventar coisas. Eu tinha que ajudar de alguma forma a melhorar esses índices horrorosos que o Brasil amarga nessas avaliações externas."

Segundo ele, o seu maior incentivo é conseguir despertar no aluno o prazer de aprender. "Eu costumo dizer que eu jogo iscas - tecnologia 3D, jogos, realidade aumentada - para trazer o aluno, para ele pelo menos tentar se envolver com aquilo, com os conteúdos que estão ali por trás. A partir do momento em que ele começa a experimentar, começa a ter essa sensação boa de 'agora eu sei um pouco mais do que eu sabia antes', aí você vê uma transformação interessante."

O professor acredita que a educação no Brasil tem melhorado, mas de uma forma muito lenta. "O ensino médio passou a ser obrigatório, a falta de professor que havia cinco anos atrás já não acontece tanto, as escolas estão com uma estrutura melhor. Mas a motivação dos alunos eu acho que não é grande coisa, pelo contrário, eu acho até que na minha época a gente não era tão desmotivado".

O trabalho do professor Guilherme Erwin Hartung com os alunos do Colégio Estadual Embaixador José Bonifácio podem ser conferidos nos sites http://www.guilhermeeh.blogspot.com.br/, http://petropolis3d.webnode.com.br/ e http://www.fractalmultimidia.blogspot.com.br/, que oferece os jogos desenvolvidos para download.
Música e história - A música está presente na vida de todos. Na adolescência, ela passa a ter uma importância maior ainda. Com essas observações, a professora Vânia Aparecida Silva Corrêa Pinto resolveu fisgar seus alunos pelo ouvido. A tarefa não foi simples, mas rendeu bons frutos, como o Prêmio Professores do Brasil.

O projeto Brasileirinho começou em 2005, quando a professora de história e filosofia no Colégio Estadual Vicente Jannuzzi, na Barra da Tijuca, propôs estudar na escola as raízes populares da cultura brasileira. "Percebi no aluno um desinteresse muito grande com relação ao universo da leitura, à cultura popular brasileira. Eu sentia que o aluno não percebia a cultura, a escola, a educação, a leitura como um valor."

Então, Vânia propôs criar uma estratégia que pudesse agregar o valor da leitura à família e à escola como um todo. O repertório escolhido foi o de Maria Bethânia. "No CD Brasileirinho, que ela estava lançando em 2005, era um convite para você conhecer o Brasil multicultural. É o Brasil do índio, do negro, do mulato, do branco. E ali eu tinha tudo pra trabalhar desde o descobrimento do Brasil, o espanto que o índio sente ao encontrar os portugueses, depois ela passa pelo povo africano, navio negreiro, Castro Alves e tudo mais, até chegar aos dias atuais."

Apesar de produção da cantora baiana não ter como foco o público adolescente, a professora afirma que só o fato de chegar com um aparelho de som e dizer que vai ter música na aula o aluno já se interessa. A partir daí, o projeto ganhou desdobramentos que passaram pela produção teatral, de dança, pintura, música e literatura. "Cada ano tem uma nuance, no ano passado teve um enfoque muito grande na literatura, fizemos um sarau musical na escola. Esse ano homenageamos Jorge Amado, que faria 100 anos, e Caetano Veloso, que fez 70. O trabalho deles dialoga entre si. Fizemos [também] mostra de cultura africana."

O projeto de Vânia ocorre na sala de aula, paralelo aos conteúdos da disciplina e, esporadicamente, ocorrem atividades no turno contrário, como passeios, shows e eventos. "Levamos um livro com a nossa produção para a Academia Brasileira de Letras e fizemos uma visita guiada com o presidente", lembra a professora.


De acordo com ela, é preciso trabalhar da melhor forma possível para fazer a diferença na vida do aluno. "O que me motiva é justamente o movimento, a ação, porque senão a gente fica naquela coisa de samba de uma nota só. Particularmente, [como] estou na escola todos os dias, tenho que estar em um lugar que me traga emoção, que me traga alegria, que me traga felicidade."


E a música foi um instrumento que canalizou a mudança. "Consegui quebrar com isso a rigidez dos currículos, porque os currículos são rígidos, os livros estão ali, a gente tem que cumprir aquele currículo, então porque não cumprir de uma forma mais lúdica, mais prazerosa? Então eu pensei nisso aí. E o aluno gosta."


Para a professora Vânia, a educação é um investimento de longo prazo. "O que desanima são as políticas públicas, que ainda não perceberam a educação como a grande base para o Brasil melhorar, o Brasil prosperar. Acho que isso é cultural", explicou.

(Agência Brasil)

Fonte: Jornaldaciencia.org.br

Imagem: Agenciabrasil.ebc.com.br